Ludopatia, Suicídio e a Juventude Brasileira: Um Olhar Necessário

O suicídio é um problema de saúde pública que vem crescendo de forma preocupante no Brasil e no mundo. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 700 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos, e no Brasil, esse número ultrapassa 14 mil casos anuais. São vidas interrompidas por uma dor muitas vezes silenciosa, que poderia ser evitada com acolhimento, informação e suporte adequados.

Ludopatia: quando o jogo deixa de ser lazer

Nos últimos anos, um fenômeno preocupante vem chamando atenção: a expansão das apostas online e do jogo compulsivo acontece paralelamente ao aumento de sofrimento psíquico entre jovens e adultos.

A ludopatia, também conhecida como jogo patológico, é um transtorno psiquiátrico caracterizado pela perda de controle sobre o impulso de apostar. A publicidade agressiva, a normalização cultural do jogo e o uso de influenciadores tornam adolescentes e adultos especialmente vulneráveis.

O jogo, quando se torna compulsão, rouba algo ainda mais precioso que o dinheiro: a esperança. Pessoas em situação de dependência relatam sentimentos de culpa, impotência, fracasso e desespero. As dívidas crescem, a autoestima despenca e o isolamento social se intensifica.

Estudos internacionais mostram que pessoas com transtorno do jogo têm taxas de ideação e tentativas de suicídio muito superiores à média da população. No Brasil, ainda há poucas pesquisas específicas, mas relatos clínicos e notícias mostram que a associação entre ludopatia e suicídio é cada vez mais evidente.

As consequências vão muito além do bolso: dívidas, ansiedade, depressão, conflitos familiares e, em casos graves, o risco de suicídio. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que entre 13% e 20% dos jogadores compulsivos já tentaram tirar a própria vida, uma taxa até 40 vezes maior que a média populacional.

Por que o tema exige nossa atenção agora?

Nos últimos anos, o Brasil tem vivido um fenômeno preocupante: a expansão das apostas online acontece em paralelo ao crescimento dos indicadores de sofrimento psíquico, especialmente entre os jovens. Para enfrentar o suicídio de forma responsável, é fundamental reconhecer a ludopatia (transtorno do jogo) como um fator de risco concreto e agir além de campanhas simbólicas.

 O suicídio é hoje um dos maiores desafios de saúde pública no Brasil.

Números que não podem ser ignorados:

  • Suicídio entre jovens: entre 2016 e 2021, a taxa de suicídio entre adolescentes de 15 a 19 anos aumentou 49%, passando de 4,4 para 6,6 por 100 mil habitantes; entre os jovens de 10 a 14 anos, o aumento foi de 45%, chegando a 1,33 por 100 mil. Folha de S.PauloAPM
  • Crescimento anual: de 2011 a 2022, as taxas de suicídio entre jovens (10–24 anos) subiram, em média, 6% ao ano, e os registros de autolesão aumentaram 29% ao ano — significativamente mais do que o crescimento geral na população, de 3,7% e 21%, respectivamente. Agência Brasil  Folha de S.Paulo 
  • Internações por tentativas: o SUS registrou 11.502 internações por lesões intencionais (tentativas de suicídio) em 2023 — o que equivale a 31 casos por dia, um crescimento de 25% em relação a 2014. Revista Oeste 
  • Busca por apoio emocional: no primeiro trimestre de 2025, o CVV (ligue 188) recebeu 643.065 ligações, refletindo crescente demanda por suporte psicológico. Embora os números oficiais ainda não estejam no ponto final, esse volume já demonstra a urgência do tema. cvv.org.br
  • Risco ligado ao jogo: estudos indicam que de 1% a 3% da população já apresenta problemas relacionados às apostas, frequentemente associados a depressão, endividamento e risco suicida. Nexo Políticas Públicas  Senado Federal



O suicídio não escolhe idade, classe social ou gênero. O que todos os casos têm em comum é um sofrimento profundo, agravado por fatores como depressão, ansiedade, abuso de substâncias, isolamento e, cada vez mais, vícios comportamentais como a ludopatia.

Setembro Amarelo: do símbolo à prática

Criada em 2015, a campanha Setembro Amarelo tem como lema atual: “Se precisar, peça ajuda!”. É a maior mobilização do país contra o estigma do suicídio.

O mês de prevenção reforça uma mensagem essencial: falar é a melhor forma de enfrentar a dor. É urgente romper o silêncio que ainda envolve o tema e ampliar as redes de apoio. A ludopatia precisa entrar nessa pauta, porque é um problema de saúde mental que ainda é pouco discutido, mas que pode levar a consequências trágicas. Por isso, campanhas de conscientização, acesso facilitado a atendimento psicológico e políticas públicas de prevenção são medidas indispensáveis.

O Papel dos Cartórios na Prevenção e Conscientização

Você pode estar se perguntando: o que os cartórios têm a ver com isso?

Pode parecer inesperado, mas os cartórios, presentes em todas as cidades e na vida de todas as famílias, podem se tornar aliados importantes na conscientização sobre a ludopatia e a prevenção ao suicídio. Sem sair de suas funções principais, esses espaços podem ser pontos estratégicos de informação, acolhimento e encaminhamento.

7 ações que os cartórios podem adotar:

  1. Campanhas visuais permanentes – Cartazes e folhetos sobre saúde mental, ludopatia e contatos de apoio, como o CVV (188).
  2. Mensagens discretas em documentos – Inserir lembretes curtos em certidões e reconhecimentos, reforçando: “Se estiver em sofrimento, peça ajuda. CVV: 188”.
  3. Rodas de conversa e palestras – Promover encontros, em parceria com escolas e comunidades, sobre dependência em jogos e prevenção ao suicídio.
  4. Capacitação da equipe – Treinar colaboradores para identificar sinais de sofrimento e orientar para os canais de ajuda.
  5. Campanhas digitais – Usar redes sociais dos cartórios para ampliar o alcance da conscientização.
  6. Datas de mobilização – Intensificar ações em setembro e no Dia Nacional de Combate à Ludopatia (19/09), mostrando engajamento social.
  7. Parcerias institucionais – Articular com CAPS, ONGs e órgãos de defesa do consumidor para oferecer informações e apoio às famílias.

Conclusão: Um Compromisso Coletivo

A luta contra o suicídio, seja causado pela ludopatia ou por outros fatores, não é responsabilidade de uma única entidade ou profissão. É um desafio coletivo que envolve famílias, profissionais de saúde, escolas, meios de comunicação e instituições como os cartórios.

Ao integrar informações e fortalecer a conscientização, podemos salvar vidas. O Setembro Amarelo é o lembrete de que nenhuma vida deveria ser perdida para o silêncio da dor — e que cada gesto de acolhimento pode ser a diferença entre o fim e um recomeço.

Se você ou alguém que conhece está em sofrimento, não hesite em buscar ajuda. Sua vida importa. Você não está sozinho.


Onde buscar ajuda agora

  • CVV – 188 (24h, gratuito) – também por chat e e-mail: cvv.org.br
  • CAPS/CAPSij – atendimento em saúde mental no SUS
  • SAMU – 192 em situações de risco imediato

Escrito por: Isabella Flores